Não tem mais jeito: o Turismo Sustentável caiu nas graças do povo (leia-se profissionais do turismo e viajantes). Provavelmente ainda não 100% na prática, mas nas palavras, nas mídias, nas promoções de agências, hotéis e destinos, só se fala nisso. E este é o caminho. Precisamos falar, falar, falar, até que as coisas de fato aconteçam e, futuramente, não precisemos nem mais trazer o assunto, porque as viagens sustentáveis serão o padrão e não apenas uma tendência.

Todos os anos vemos várias projeções de tendências em viagens levantadas por empresas diversas. Essas tendências são normalmente baseadas em iniciativas e padrões que já estão acontecendo. Mas precisamos ter a consciência de que isso não significa que elas vão direcionar o turismo e todo o setor vai abraçá-las. O mesmo vale para as tendências em viagens sustentáveis, que tenho buscado trazer todos os anos para vocês. A ideia é irmos além de dizer que o turismo sustentável é uma tendência e olharmos para o que tem acontecido dentro da proposta de viagens mais conscientes.

Convido vocês a lerem também as tendências em viagens sustentáveis que propus para os anos anteriores, já que elas vão sempre se complementando (ou não 😉). E, quem tiver interesse em aprofundar ainda mais a reflexão, vale à pena dar uma olhada nestas 7 tendências de viagens com foco mais consciente que a Impact Travel Alliance propõe para 2023.

Há um item que não coloquei entre as tendências porque acho que ainda não estamos tão preparados para isso, mas proponho também a reflexão sobre como o Metaverso pode nos ajudar a apoiar iniciativas de impacto positivo nas viagens. Ele é uma realidade cada vez mais presente no turismo e, certamente, pode ser usado para promover o bem em diversos sentidos.

Aí vão minhas projeções para o ano de 2023:

1. Trocas e conexões humanas: um olhar para as pessoas

Turismo não é feito apenas de destinos, mas, principalmente, de pessoas. Acima de tudo, somos humanos e parte de uma grande comunidade global. À medida que o turismo se torna mais consciente, nossas viagens passam a ser menos individualistas e egoicas e descobrimos que as conexões que criamos durante as viagens são valiosíssimas. A diversidade, a inclusão e a acessibilidade se tornaram premissas do Turismo Sustentável e, nesse aspecto, estamos falando também de pessoas. Os maiores ativos de um destino podem (e devem) ser seus moradores. De acordo com a Organização Mundial do Turismo (OMT), “a sustentabilidade e as pessoas devem estar no coração do turismo em 2023”.

2. Cidades antes de destinos, moradores antes de visitantes

O Turismo Responsável destaca que “destinos precisam ser bons para se viver e visitar – nesta ordem”. A obsessão de muitos lugares com o número de turistas vem esquecendo de priorizar as necessidades de seus moradores e da própria dinâmica ambiental local. No entanto, alguns destinos já vêm percebendo que não poderão ser bons anfitriões se seus moradores não estiverem felizes. Da mesma forma, os viajantes precisam entender que estão visitando “as casas” de pessoas e o respeito é o primeiro passo. As viagens precisam deixar de ser sobre satisfazer o prazer dos viajantes e passar a ser sobre gerar transformações positivas para todos.

3. Natureza Positiva e Turismo Regenerativo recuperando a biodiversidade

Natureza Positiva é uma abordagem que busca interromper, reduzir e recuperar os impactos negativos do homem na natureza, revertendo a atual perda de biodiversidade. A COP 15 mostrou que precisamos tomar atitudes urgentes para reverter a enorme destruição que já causamos à nossa biodiversidade – afinal, dependemos dela para sobreviver – e o turismo precisa fazer sua parte nessa regeneração. A Natureza Positiva não é uma filosofia, mas sim uma metodologia para ações regenerativas e pode ser facilmente aplicada ao turismo. Em 2022, o World Travel & Tourism Council elaborou um relatório completo com um guia passo a passo para adotarmos essas medidas.

4. Compensação de emissões e ações climáticas

Ações focadas na neutralização e redução das nossas emissões são cada vez mais urgentes e necessárias. Durante a COP26, em 2021, empresas de turismo e governos assinaram a Glasgow Declaration on Climate Action in Tourism, se comprometendo a agir imediatamente para cortar as emissões globais do turismo (8% do total) em pelo menos a metade durante a próxima década e alcançar emissões zero o mais rápido possível, antes de 2050. Já ouvimos falar em diversos hotéis e até destinos carbono zero. Enquanto desenvolvemos soluções e inovações viáveis, a compensação das emissões através da restauração de áreas verdes continua sendo um bom primeiro passo.

5. Responsabilidade compartilhada

De acordo com o relatório Sustentabilidade no Turismo: desafios, oportunidades e o papel da Booking.com, 64% dos hoteleiros acreditam que a responsabilidade e comprometimento com viagens mais sustentáveis deve partir dos viajantes, enquanto 37% dos viajantes acham que a responsabilidade é dos governos. Precisamos parar de “empurrar” a responsabilidade para o outro e entender que ela deve ser compartilhada. Todos nós devemos fazer a nossa parte: aprendendo, agindo e conscientizando o outro. O termo Turismo Responsável, inclusive, vem da ideia de assumir a responsabilidade. E não há melhor maneira de fazer isso do que através da colaboração e da cooperação. Diversas iniciativas tanto do setor público quanto do privado têm comprovado a eficiência e benefícios das parcerias para a conservação e para ações sociais positivas.

6. Ecogastronomia e alimentação consciente

As práticas de sustentabilidade precisam alcançar urgentemente a cozinha, pois está aí um dos locais onde mais se expressa a desigualdade social: enquanto milhões passam fome, restaurantes desperdiçam alimentos diariamente. Além disso, de acordo com a ONU, o setor de alimentação é responsável por 22% das emissões globais de gases de efeito estufa durante os processos de produção e decomposição. Muitos hotéis já estão agindo para reduzir o consumo, reaproveitar alimentos, trabalhar exclusivamente com produtores locais. É bom lembrar que o tipo de alimento e sua procedência refletem não apenas a pegada de carbono, mas também o bem-estar animal.

7. Preservação dos oceanos

Estamos na década dos oceanos e diversas notícias tristes chegam a nós diariamente relatando poluição, morte de animais e perda de diversidade nos mares – fatos que influenciam diretamente no turismo em diversas regiões do mundo. O turismo precisa entender que depende do oceano para sobreviver e assumir seu papel na preservação e regeneração da vida marinha. Ótimos exemplos são os berçários de corais da Biofábrica de Corais (PE) e da rede de hotéis Iberostar (América Central).

8. Visitas a comunidades indígenas e quilombolas

Os povos originários estão ganhando nova projeção no Brasil e no mundo com sua atuação de resistência e protagonismo e com as políticas do novo governo. O interesse em visitar comunidades e se conectar com essas pessoas está crescendo. Mas precisamos ter consciência de que nem toda visita a uma comunidade tradicional é uma viagem responsável!!! Esteja sempre atenta (o) a quem está te levando para a visita; se os comunitários são os protagonistas e tomam as decisões sobre o turismo no local e se estão interagindo e se conectando com os visitantes sem que o turismo atrapalhe a vida na comunidade.

9. Grandes empresas abraçando o turismo sustentável

Estamos vendo, finalmente, as grandes empresas do turismo abraçando a sustentabilidade, seja por pressão ou convicção. Embora seja muito mais difícil alcançar a sustentabilidade em empresas que, contraditoriamente, apoiam o turismo de massa, é essencial que estas companhias embarquem nessa jornada, afinal são elas que vão fazer a grande diferença em volume de impactos positivos no mundo. Empresas como a Booking.com, Expedia e a rede Accor de hotéis, por exemplo, têm planos e metas ousadas para tornarem-se mais sustentáveis.

10. Transportes mais sustentáveis e menos voos

Estamos preparados para deixar de voar? Afinal de contas, os voos são os maiores responsáveis pela alta emissão de gases de efeito estufa durante nossas viagens. No Brasil, com suas dimensões continentais e sem a alternativa do transporte ferroviário, reduzir o número de voos ainda parece um sonho distante. Na Europa, porém, essa já é uma realidade para muitas pessoas. É o caso do movimento Flight Free UK que busca convencer as pessoas a não usarem mais os aviões. Enquanto isso, as companhias aéreas e também as grandes empresas de cruzeiros estão assumindo sua responsabilidade na enorme pegada de carbono que produzem e investindo em projetos e alternativas, como o combustível de aviação sustentável, redução de plásticos de uso único e compensação de emissões.

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