Quarenta por cento dos brasileiros acham que não geram nenhum impacto para os oceanos. 26% acreditam que o oceano não influencia em nada na sua vida. 75% nunca viram de perto recifes de corais. 10% nunca estiveram na praia. E, ainda que 86% dos brasileiros não conheçam nem nunca tenham ouvido falar de Economia do Mar ou Economia Azul, 82,2% dizem estar dispostos a mudar seus hábitos pelo bem do oceano. Estes são alguns dos números que aparecem no recente relatório “Oceano sem Mistérios: A relação dos brasileiros com o mar”, divulgado pela Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, em parceria com a Comissão Oceanográfica Intergovernamental da Unesco, Unesco Brasil e Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), durante a Conferência dos Oceanos das Nações Unidas, em Lisboa, Portugal, em junho de 2022. O estudo foi desenvolvido com as premissas do Conexão Oceano, uma iniciativa que busca fortalecer a comunicação sobre o ecossistema costeiro-marinho para sensibilizar a sociedade sobre a importância e urgência do tema.
De acordo com Janaína Bumbeer, especialista em Conservação da Biodiversidade na Fundação e doutora em Ecologia e Conservação com foco em ambientes marinhos, o maior inimigo dos ecossistemas marinhos é a falta de conhecimento: “Ainda não falamos de forma suficiente sobre o oceano. Mesmo a população que vive próxima à costa tem um conhecimento raso sobre a importância do mar para a nossa vida. Na verdade, nem mesmo a ciência ainda sabe o suficiente, pois conhecemos apenas 20% do fundo marinho. Conhecemos mais a lua que o próprio oceano”. Além da disposição para mudar seus hábitos, 61% dos entrevistados afirmaram que praticam sempre o turismo responsável ao viajar. No entanto, apenas 25% costumam buscar informações sobre o oceano.
19% dos brasileiros não evitam o uso de plásticos descartáveis
A pesquisa mostrou a população dividida em relação a práticas sustentáveis. O percentual de pessoas que priorizam com frequência compras com menor impacto na natureza e no oceano, como produtos com menos embalagens e sem poluentes, foi de 48%. Dezoito por cento nunca se preocupam com essa questão. Apenas 35% dos brasileiros afirmam sempre evitar o uso de plásticos descartáveis, mas 19% dos entrevistados nunca evitam.
“Cerca de 80% da poluição encontrada no mar vêm do continente. Se fizermos projeções a partir dos dados encontrados, chegamos a resultados preocupantes”, salienta Malu Nunes, diretora executiva da Fundação Grupo Boticário. Considerando que cerca de 68 milhões de brasileiros (32%) não evitam o uso de copos plásticos e cada uma dessas pessoas faça uso de três unidades de 200 mililitros por semana, chega-se a mais de 10,6 bilhões de unidades por ano. Cada copo pesa em média 1,8 gramas, o que significa 19,1 mil toneladas de copos plásticos que o brasileiro usa anualmente.
“O oceano começa na nossa casa, mesmo que estejamos a muitos quilômetros de distância do mar. Como boa parte das pessoas tem pouco contato direto com os ambientes marinhos, esta percepção precisa ser estimulada. Os mares geram alimentos, energia, minerais, fármacos e milhões de empregos ao redor do mundo em diferentes atividades econômicas. São imprescindíveis para o transporte e o comércio internacional, além de importantes para o nosso lazer e bem-estar. Cuidar do oceano é cuidar da nossa saúde”, salienta Ronaldo Christofoletti, professor do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), copresidente do Grupo Assessor de Comunicação para a Década do Oceano da Unesco e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN).
Economia Azul e Economia do Mar
A Economia do Mar abrange todas as atividades econômicas desenvolvidas sob influência direta do ambiente costeiro-marinho ou a partir de recursos vindos do oceano. Já a Economia Azul engloba o uso sustentável dos mares. São conceitos distantes da grande maioria. Ainda de acordo com a pesquisa ‘Oceano sem Mistérios: A relação dos brasileiros com o mar’, quando perguntados sobre a relação de alguns setores econômicos com o oceano, 27% dos respondentes indicaram que o Turismo e Hotelaria estão conectados aos mares; apenas 4% veem relação com a indústria; 2% relacionam com atividades esportivas e culturais e 1% indicam a proximidade dos oceanos com a agricultura.
Brasil está entre os 20 países que mais contribuem para a poluição plástica nos oceanos
Outro estudo inédito, também apresentado na Conferência dos Oceanos, e encomendado pelo Blue Keepers, projeto ligado à Plataforma de Ação pela Água e Oceano do Pacto Global da ONU no Brasil, aponta que cada brasileiro pode ser responsável por poluir os mares com 16 quilos de plásticos por ano. São 3,44 milhões de toneladas de lixo plástico que chegam aos oceanos anualmente, representando um terço do plástico produzido em todo o Brasil. A pesquisa faz parte dos dois primeiros relatórios produzidos pelo Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo.
“O estudo traz estimativas sobre a realidade brasileira em relação ao caminho que os resíduos percorrem até chegar ao mar, sinalizando estratégias que podem ser analisadas com os municípios com maior urgência e eficácia”, afirma o professor da USP, Alexander Turra, responsável pela Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano e membro da RECN.
O levantamento observou que existe alto risco desse estoque plástico chegar até o oceano por meio de rios. O nível de risco varia ao longo do território brasileiro, mas áreas como a Baía de Guanabara (RJ), rios Amazonas (Amazonas e Pará), São Francisco (entre Sergipe e Alagoas), foz do Tocantins (Pará) e a Lagoa dos Patos (Porto Alegre) são especialmente preocupantes. Além disso, diversos municípios, mesmo no interior, têm alto risco de contribuir para o lixo plástico encontrado no oceano e, por isso, é necessário agir localmente na questão.
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