Viajante Responsável

Turismo sustentável é para todos? Qual o preço da inclusão e diversidade nas viagens?

Turismo sustentável é para todos
Escrito por Ana Duék

Fácil de falar ou julgar. Nem sempre tão simples de realizar. Há quem não mude seus hábitos de consumo pela sobrevivência do planeta por preguiça. Às vezes, por falta de informação – que, cá entre nós, é uma desculpa cada vez menos válida, diante do mundo de informações que temos à nossa disposição. Mas existem outros fatores bem mais complexos. De acordo com uma recente pesquisa da Booking.com com mais de 11 mil viajantes LGBTQ+ no mundo todo, 9 em cada 10 (92%) viajantes LGBTQ+ brasileiros dizem que precisam considerar sua segurança e bem-estar antes de escolher um destino. Além da questão da segurança, no caso das pessoas negras e indígenas existe ainda outra barreira: a financeira. Embora o número de viajantes negros esteja crescendo – no Brasil não temos dados, mas nos Estados Unidos, os afroamericanos gastaram o equivalente a 109,4 bilhões de dólares em viagens em 2019, representando 13.1% do mercado de viagens lazer, de acordo com o estudo The Black Traveler: Insights, Opportunities & Priorities sabemos que viajar ainda é um enorme privilégio branco.

Há tempos debatemos, dentro da ideia de promover um turismo mais sustentável, sobre que turista queremos receber nos nossos destinos. Quem é o turista “ideal”?. No ano passado, assistindo a uma palestra do ex-ministro do Turismo da Costa Rica, me incomodei bastante ao ouvi-lo comemorar como conseguiram aumentar o ticket médio do país. “Bom para quem?”, pensei eu. Destinos que estão vivendo o excesso de turistas, como Amsterdam, Barcelona ou Veneza, estão cada vez mais caros. Aumentos de preços e taxas de turismo têm funcionado como boa estratégia para lugares que têm uma capacidade de carga limitada, como Fernando de Noronha ou Jericoacoara. Os preços vão fazendo uma falsa “seleção natural dos turistas” e afugentando quem não pode pagá-los.

Enquanto isso, queremos que nossos turistas não apenas paguem mais caro, mas sejam também mais conscientes. Para evitar gastos ou trabalho, o mercado deposita a responsabilidade por um turismo mais sustentável nos viajantes ao invés de agir e disponibilizar práticas que ajudem a conscientizá-los. O relatório Sustainability in tourism: challenges, opportunities and the role of Booking.com 2022 mostra que 64% dos hoteleiros acreditam que a responsabilidade por reduzirmos os impactos negativos das viagens é dos viajantes, enquanto apenas 47% deles acham que a responsabilidade é do setor. Esse ótimo texto reflete justamente sobre “Quem é o viajante certo?” e pergunta: “ao invés de focarmos no pequeno segmento do mercado preparado para pagar pela sustentabilidade, como podemos começar a ajudar todos os turistas a fazerem escolhas mais responsáveis?”.

Para completar as “pressões”, a mídia (onde me incluo) segue orientando como os viajantes podem ser mais conscientes sem sequer refletir sobre o que é realmente possível para cada indivíduo. Eu faço isso há anos e confesso que só recentemente comecei a pensar que as escolhas que nos levam a atitudes mais sustentáveis têm diferentes pesos e medidas – assim como a imensa desigualdade social que vivemos. Turismo sustentável deveria ser para todos. Mas ainda não é.

Recentemente, acompanhei um enorme debate nas redes sociais sobre como o fato de a Shein (empresa se fast fashion) lançar uma coleção sustentável vai contra a própria natureza da existência dela ao explorar mão de obra barata. Comecei a ler os comentários indignada com as pessoas que defendiam a loja, mas acabei sendo obrigada a pensar: a Shein possibilitou que muitas pessoas tivessem acesso a produtos que, de outra forma, não conseguiriam comprar. E aí podemos até debater a questão do consumismo, mas precisaríamos entrar também na polêmica sobre a necessidade de viajar. Se todo mundo precisa comprar menos, pelo bem do planeta, também precisamos viajar menos, certo?

Sou sempre a primeira a querer desmistificar as questões que envolvem a sustentabilidade, começando pelo preço. Temos sempre a sensação de que tudo o que é sustentável é mais caro. Embora hoje já existam muitas alternativas para diferentes bolsos, em muitos casos um comportamento mais responsável exige mesmo mais dinheiro. Como podemos exigir de alguém que está fazendo uma viagem com dinheiro contado, talvez pela primeira vez na vida, escolha um voo com menos emissões de carbono, um hotel sustentável, fique mais dias no destino fazendo uma slow travel, consuma apenas produtos locais e não se preocupe com os preços?

O que é mais vergonhoso, na verdade, é que ainda não entendemos que inclusão, diversidade, equidade e acessibilidade são questões intrínsecas da sustentabilidade. Não dá mais para debater sustentabilidade ambiental, sem considerar todos os aspectos do social. Faz sentido então ficarmos debatendo turismo sustentável dentro de um pensamento branco e elitista?

O quão sustentável e inclusivo pode ser um hotel ou destino que só é acessível para pessoas ricas, brancas e sem nenhuma deficiência ou restrição de mobilidade? Está mais do que na hora de o setor de turismo investir em sustentabilidade considerando também acessibilidade, inclusão e preço. As inovações, as ações afirmativas e a escuta ativa estão aí para nos ajudar.

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Sobre o Autor

Ana Duék

Jornalista de viagens com Mestrado em Gestão de Turismo e Hospitalidade pela Middlesex University (Londres). Desde 2015 defendendo um turismo mais consciente. Acredito que as viagens podem gerar mais impactos positivos para viajantes e para os destinos que nos recebem. Vamos descobrir como?