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Turismo Regenerativo: o que é a nova proposta para viagens que podem recuperar o planeta?

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Vila Mogol, a experiência de turismo regenerativo do Ibiti Projeto, em Minas Gerais | Foto: Comuna do Ibitipoca
Escrito por Ana Duék

O que é Turismo Regenerativo?

Com uma visão sistêmica que abrange a relação do homem consigo mesmo, com o outro e com a natureza, o Turismo Regenerativo propõe uma mudança de valores que vão além da minimização de danos proposta pela sustentabilidade. Aliando os saberes indígenas ancestrais e conhecimentos da ciência ocidental, o Turismo Regenerativo tem o objetivo de promover destinos e relações saudáveis, buscando não só preservar, mas sim recuperar, resgatar, regenerar, os diversos impactos negativos que já causamos para ecossistemas, culturas e indivíduos enquanto atividade turística. Embora tenha a natureza como eixo central, o Turismo Regenerativo também considera os pilares social, econômico, político e espiritual.*

Já falamos aqui sobre as diferenças entre Turismo Responsável e Sustentável. Da mesma forma que a ideia de Turismo Responsável surgiu, em 2002, para dar conta das questões que o Turismo Sustentável não estava resolvendo, a visão do Turismo Regenerativo também traz o propósito de buscar soluções para as emergências e crises vividas pelo mundo atual, que as práticas de sustentabilidade no turismo não têm conseguido endereçar e resolver. Essas emergências vão desde as mudanças climáticas, à fome e desigualdade social e racial.

Especialistas acreditam que o movimento por um turismo sustentável e a proposta de apenas não comprometer o futuro para as próximas gerações não está funcionando. “Sustentar somente já não é suficiente. Precisamos recuperar, regenerar, sermos proativos”, explica o naturalista e empresário chileno Jorge Moller Rivas, diretor da ONG Regenera, que há anos já defende o Turismo Regenerativo como solução. É um despertar para entendermos que destruir para depois apaziguar não está funcionando.

“Na sustentabilidade tentamos manter nosso modo de vida, agregando uma parte da compensação. Mas precisamos perceber que a situação em que nos encontramos não pode mais ser sustentada e que estamos imersos em uma grande crise sistêmica (climática, ecológica, energética)”, alerta Sonia Teruel, gerente de Desenvolvimento de Negócios da Totonal Viajes e Mestre em Gestão de Turismo Sustentável pela Universidade para a Cooperação Internacional (Costa Rica) com a tese: “Análise e abordagem à definição do paradigma do Turismo Regenerativo”.

A estrategista e fundadora da Concious Travel, Anna Pollock, já alerta, desde 1995, para a necessidade de mudarmos nossa visão e atitudes em relação ao turismo, entendendo ele não como uma indústria, mas como um sistema vivo, em evolução, que se conecta com tudo o que está à sua volta. Em 2019 ela escreveu: “O Turismo Regenerativo é baseado em um novo entendimento de que a economia do visitante e o destino não são uma linha de produção industrial, mas um sistema vivo e conectado em rede, inserido em um sistema chamado Natureza e sujeito às regras e princípios operacionais da Natureza”. Esta perspectiva se baseia nos saberes ecológicos indígenas, que são bases para o princípio de regeneração, e sempre entenderam a natureza como o centro de tudo e o homem como parte dela.

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Foto: Viajar Verde

Desenvolvimento Regenerativo como inspiração

Embora o conceito de Turismo Regenerativo ainda seja muito recente, as ideias sobre regeneração já são discutidas desde os anos 1930. No final do século passado, o Regenesis Group lançou o conceito de desenvolvimento regenerativo, que justamente traz uma evolução na proposta e prática do desenvolvimento sustentável. De acordo com o grupo de pesquisadores e educadores, o desenvolvimento regenerativo exige novas abordagens e valores, onde o homem volte a se entender como parte da natureza e busque co-evoluir com ela.

Esse olhar baseado na cultura e saberes indígenas, que considera a complexidade do mundo, busca uma colaboração com a natureza e entende que a atividade humana pode ser uma fonte de saúde e regeneração, ao invés de destruição e degradação, traz fundamentos que são as bases para o Turismo Regenerativo. (Confira o Manifesto pelo Desenvolvimento Regenerativo)

O que o Turismo Regenerativo não é

“O primeiro passo para a transição para a regeneração é desaprender”, provoca Sonia Teruel. “Precisamos entender também o que o turismo regenerativo não é – ele não é uma nova forma de chamarmos o Turismo Sustentável; não é um nicho de viagens, como o ecoturismo; não é uma metodologia com fórmulas e normas; não é um objetivo final e sim um caminho”.

De acordo com Sonia, temos a tendência em pensar em objetivos e metas concretas sem pensar no caminho que nos leva a eles. É justamente isso que a ideia de regeneração vem propor: olharmos para o que nos move. “Mais do que uma mera restauração, estamos falando sobre fortalecer a capacidade dos sistemas que sustentam a vida do lugar, para que eles se desenvolvam junto com suas comunidades. Uma experiência regenerativa funciona para criar a conexão entre o homem consigo mesmo, com os outros (os anfitriões locais) e com a natureza”, esclarece Sonia.

O Turismo Regenerativo também questiona a visão mercadológica e voltada para o crescimento que ainda está inserida no Turismo Sustentável. Afinal, até que ponto o crescimento pode gerar apenas impactos positivos?

Veja mais nesse artigo de Sonia Teruel para o Travindy Brasil e na entrevista para o Echoes of the Journey

Exemplo brasileiro em Minas Gerais

Há mais de uma década os valores de regeneração já fazem parte do trabalho do Ibiti Projeto, localizado em Conceição do Ibitipoca, Minas Gerais, que se define como “um espaço que busca uma relação harmônica entre o ser humano e a natureza, certo de que esse contato somado ao respeito à diversidade, é a chave para um futuro resplandecente”.

“O Ibiti Projeto nasceu há 40 anos, com a compra de terras no entorno do Parque Estadual de Ibitipoca, para aumentar a área de preservação do parque. Há 10 anos, abrimos a pousada com o intuito de trazer uma função econômica para aquela preservação ambiental, segurar as pessoas no campo e, já que é para gerar renda, vamos valorizar também a cultura local”, conta Claudia Baumgratz, diretora do Ibiti.

Hoje, ocupando uma área de mais de cinco mil hectares, o projeto abrange não só vários conceitos de hospedagem e experiências, mas também cuida da regeneração do ecossistema e de uma relação positiva com os moradores locais. Claudia conta que, com o tempo, se depararam com a proposta do Rewilding, “que é o conceito de trazer de volta a natureza, mas deixando ela ser livre. Só reflorestar já não ia trazer os grandes mamíferos que habitavam ali anteriormente. Estamos então com o trabalho de regeneração natural e também de reintrodução de espécies”.

Dentro do olhar holístico da regeneração, o Ibiti também atua localmente buscando impactos positivos para os moradores da região. Um dos projetos mais recentes é a restauração da pequena vila Mogol, que foi quase totalmente abandonada pelo êxodo rural e agora está se transformando em uma comunidade modelo, com economia compartilhada, energias mais amigáveis, restaurante vegetariano e hospedagem para quem que ter a experiência de passar os dias em uma vila do interior. “É um processo longo onde buscamos o desenvolvimento, mas fazemos tudo sempre alinhando com o que querem os moradores da vila”, explica Claudia.

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Em uma área de mais de cinco mil hectares, o Ibiti Projeto usa os princípios do Rewilding para regenerar a natureza e estar em harmonia com a comunidade local | Foto: Ibiti Projeto

Princípios do Turismo Regenerativo

Reuni aqui alguns princípios do Turismo Regenerativo propostos por Sonia Teruel para o Echoes of the Journey e mesclei com outros observados por mim:

Pensamento sistêmico: sistemas vivos são sistemas abertos, interconectados, que interagem e coevoluem com o seu ambiente. É importante entendermos que os indivíduos não são seres isolados. Vivemos em um mundo complexo e que cada relação implica em outra ou é dependente de diversas variáveis.

– Três relações: precisamos voltar a entender como dependemos integralmente da natureza e como somos parte dela. O homem volta a valorizar sua relação consigo mesmo, com o outro e com a Terra. Essa ainda é a visão de muitas comunidades tradicionais no Brasil e no mundo.

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Turismo Regenerativo

Natureza como pilar principal: embora a natureza passe a ser o pilar principal, e o Turismo Regenerativo também considere os pilares sociocultural e econômico (como na sustentabilidade), entram ainda os aspectos políticos e espirituais de um destino e comunidade.

Colaboração e inteligência coletiva: trabalhar em colaboração com todos os atores envolvidos, buscando benefícios mútuos. Gerar valor para todos, visando também a sustentabilidade econômica.

Respostas locais e sentido de lugar: entender as características e culturas locais, redescobrindo o lugar e atentando para suas particularidades e diversificação. Como já propõe o Turismo Responsável, pensar em soluções locais para questões globais e também para os processos únicos da vida em cada destino.

Comunidade local como protagonista: ao olhar para o local, precisamos entender que as comunidades e destinos são os protagonistas e tomadores de decisão e eles poderão dizer o que é melhor para aquele lugar. “Um bom lugar para se visitar precisa ser primeiro um bom lugar para se viver”.

– Qualidade ao invés de quantidade: buscar um crescimento do turismo em métricas qualitativas ao invés de quantitativas. Desenvolver o turismo ampliando seus benefícios, ao invés de ampliar números.

– Desconstruir nosso modelo de negócios: reinventar nosso modelo de negócios tradicional.

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Foto: Totonal Viajes

Negócios regenerativos – por onde começar a transformar sua empresa?

Se você chegou até aqui deve ter notado que trabalhar a partir de uma abordagem regenerativa pode não ser tão fácil, já que vai contra a visão de negócios que nos acostumamos tradicionalmente. Para isso, o Regenesis Group criou a metodologia do Design Regenerativo, que hoje já está sendo adaptada diretamente para empresas de turismo.

Sonia Teruel Totonal

Sonia Teruel, gerente de Desenvolvimento de Negócios da Totonal Viajes

Perguntamos a Sonia Teruel por onde um profissional ou empresa pode começar. Aqui vão as dicas dela:

“Em primeiro lugar, eu recomendaria desaprender totalmente. Sugiro que façam um workshop de turismo regenerativo e leiam muito sobre isso. Que entendam em profundidade o que é regeneração. Isso é importante porque, do contrário, podemos cair em uma reformulação da marca do Turismo Sustentável”.

“Este é um exercício sistêmico que deve mudar nosso “business as usual”. Portanto, é preciso dar um passo atrás e recomendo fortemente fazer um exercício em organizações vivas, onde redefinam sua identidade, visualizem o futuro que desejam e criem seu propósito individual e comum – não só os gestores das empresas, mas com a equipe também. Por fim, aproximem-se dos anfitriões dos destinos e conheçam sua história e a sensação do lugar. Conheçam a identidade e a sua finalidade e não façam imposições nem se deixem levar apenas pelo “que se vende”. Gerem conversas e fortaleçam os laços. E então, co-criem experiências autênticas e inovadoras que podem ser transcendentes”.

Para formações em Turismo Regenerativo e Desenho de Experiências em Turismo Regenerativo, recomendamos os cursos da Iniciativa Global de Turismo Regenerativo.

*Importante falar que este é um resumo desenvolvido por mim, Ana Duék, apenas a título de compreensão, uma vez que ainda não há uma definição universalmente aceita para o Turismo Regenerativo.

 

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Sobre o Autor

Ana Duék

Jornalista de viagens com Mestrado em Gestão de Turismo e Hospitalidade pela Middlesex University (Londres). Desde 2015 defendendo um turismo mais consciente. Acredito que as viagens podem gerar mais impactos positivos para viajantes e para os destinos que nos recebem. Vamos descobrir como?

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