O cantinho do Brasil que pouca gente conhece, e que todo mundo deveria conhecer…
Em julho de 2017 embarquei em direção ao Vale do Jequitinhonha, em uma viagem por uma das regiões mais contrastantes do Brasil: onde tudo parece infértil, há um enorme potencial para a produtividade, um grande sentido de fartura e uma frequente propensão para a fertilidade.
A viagem que eu tanto sonhei foi proporcionada pela operadora Vivejar, que há muitos anos trabalha junto com as mulheres do Vale do Jequitinhonha, por meio da empresa social Raízes Desenvolvimento Sustentável, para desenvolver um programa de turismo comunitário e social que ofereça aos viajantes um gosto especial do que é a vida naquelas terras e, ao mesmo tempo, dê retorno positivo e financeiro para as comunidades locais.
Nossa viagem começa em Belo Horizonte e segue por terra em direção a Diamantina, que fica no Alto Jequitinhonha. Passamos a tarde e a noite mergulhando no clima colonial e nas primeiras histórias da força feminina daquela região, representada pela escrava alforriada Chica da Silva, que nasceu na região. Mas as deliciosas histórias desta cidade Patrimônio da Humanidade ficarão para outro post.
No dia seguinte bem cedo, partimos para nosso destino final, Coqueiro Campo, na zona rural entre Turmalina e Minas Novas, uma das três comunidades que visitamos em nosso roteiro. Conforme a estrada ruma ao norte, vemos o sertão tomar o lugar do verde, até que somente terra, caatinga e plantações de eucalipto dominam a paisagem.
Chegamos em Campo Buriti e Coqueiro Campo e fomos surpreendidos por um delicioso almoço mineiro e a hospitalidade de Rita, uma das incríveis artesãs que dividem suas vidas entre cuidar da família e da casa e o trabalho com o artesanato em cerâmica. Com um sorriso largo e sempre carinhosa, Rita me recebeu durante os quatro dias da viagem, fazendo com que eu me sentisse em casa. Cada um dos viajantes do grupo foi acomodado em outras hospedagens familiares.
As casas que nos recebem são de mulheres ceramistas que se uniram em torno da arte, da profissão, da paixão em comum e dos desafios a superar. Há muitos anos, elas descobriram no barro uma oportunidade de independência, liberdade, reconhecimento e autoafirmação. Aprenderam o ofício com a geração de suas mães e avós, que começaram a fazer cerâmica como utilidade do lar e não como arte.
Em uma terra onde (quase) nada dá, os maridos saem de casa para tentar a vida nas cidades e deixam para trás as esposas e filhos. Ainda assim, família é um laço primordial para estas mulheres, assim como a amizade e parceria que elas criaram entre si. Hoje, as cerâmicas do Vale do Jequitinhonha viraram referência no artesanato nacional, profissão e motivo de orgulho de muitas mulheres. São elas, as cerâmicas e as artesãs, que inspiram o roteiro da nossa viagem, em uma narrativa de vivência artística, gastronômica, histórica e, acima de tudo, de empoderamento feminino.
A Associação dos Artesãos de Coqueiro Campo, que recebe também artesãs da comunidade vizinha, Campo Buriti, reúne mais de 40 pessoas. Juntas, elas se apoiam mutuamente na produção, divulgação, comercialização e venda de suas peças. Elas nos recebem na manhã seguinte à nossa chegada para a primeira etapa da produção da nossa arte. Sim, o objetivo é colocarmos a mão na massa e fazermos nossa própria peça de cerâmica!
Começamos pela primeira etapa. Guiados por Valdirene e Renata, fizemos uma pequena trilha até o barreiro, de onde as mulheres tiram sozinhas o barro com enxada. A tarefa não é fácil. Acreditem, eu tentei!
No segundo dia, o barro já está pronto para ser amassado, batido e modelado. Nossa oficina acontece na casa de Deuzani, uma das mais queridas artesãs locais. As duas filhas já estão no mesmo caminho e nos acompanham, explicando os processos e ajudando na modelagem das peças. É rápido, e fácil, se encantar com Deuzani e seu jeito suave e decidido, um abraço macio e forte ao mesmo tempo. Ela também é poeta e lê para nós um poema que retrata, sob seus olhos, a realidade das mulheres locais.
No terceiro dia é a vez da oficina de oleio – hora de pintar nossas peças com tintas naturais. E, finalmente, encerramos com a cerimônia da queima, quando as artes vão para o forno à lenha. Nossos dias seguiram, cercados de indescritíveis comidas mineiras caseiras e muita boa prosa com mulheres incríveis. Ouvimos as histórias de Anísia, que também recebe turistas na comunidade de Campo Alegre, e começou na cerâmica ainda criança, fazendo brinquedos e pedindo que sua mãe vendesse nas feiras. Visitamos o encantador jardim de Zezinha, uma das mais conhecidas artesãs da região e uma das únicas que conta com o apoio do marido, Ulisses, na comercialização de suas peças.
Todas essas mulheres incríveis têm se dedicado ao turismo também, recebendo os viajantes no Vale do Jequitinhonha com carinho, comida pra lá de boa e uma hospitalidade irreparável. É a combinação perfeita de um turismo que mostra as verdadeiras raízes e a cultura do Brasil ao mesmo tempo em que promove o bem – uma experiência que todos deviam viver ao menos uma vez na vida!
Veja mais: Embarque em uma viagem transformadora com a Vivejar
Como mulher, em um momento em que tenho sentido cada vez mais a importância da união feminina, me senti bastante parte daquilo tudo. Foi um aprendizado sobre como podemos nos reinventar e nos fortalecer e seguir adiante fazendo coisas do bem, que nos fazem bem, que produzem o bem. O sorriso e o carinho das mulheres artesãs do Vale segue guardado comigo.
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